Seu Planejamento Financeiro

Em 2021, minha meta é quitar dívidas. Como se planejar?

Jaques Cohen, CFP®, responde:

Caro leitor, a escolha da sua meta já é um passo importante. Mesmo assim, na primeira parte da resposta focaremos essa etapa, já que as dívidas são a realidade em mais de 65% das famílias brasileiras*.

Ao escolher metas para o ano, temos que conciliar tudo aquilo que queremos com as possibilidades do mundo real, sabendo que estamos sujeitos a uma série de imprevistos.

Existe uma diferença entre expressar uma vontade, como “ser mais saudável” ou “quitar dívidas”, e sustentar emocionalmente uma decisão. Isso envolve reconhecer realidades objetivas e subjetivas, e colocar as várias vontades lado a lado, para então renunciar a algumas e priorizar outras. Com isso, desenha-se um norte para uma trajetória que não é linear – nem do ponto de vista dos nossos conflitos internos, nem daquilo que o ambiente externo tem a nos reservar.

Em paralelo, também é preciso o cuidado de não perder de vista outros objetivos que você quer realizar assim que quitar o que deve. Sonhos e projeções de futuro são uma importante fonte de plasticidade afetiva e resiliência ao longo da jornada, assim como a exploração de campos como das artes, dos esportes, da espiritualidade e do conhecimento.

Partindo agora para uma perspectiva mais objetiva, precisamos de um diagnóstico do seu caso, como se fosse um raio X ou um exame de sangue: qual é a sua renda mensal? Quanto gasta? O que tem de patrimônio? E de dívidas? Essas perguntas, se bem exploradas, darão um panorama da sua realidade financeira. Volte e as leia quantas vezes for preciso.

Alguns comentários:

– A renda precisa ser pensada depois de impostos; e, no caso dos autônomos, entendida com calma, já que varia mais.

– Sobre os gastos, em um primeiro momento olhe bem para o seu histórico para depois não errar a mão fazendo um orçamento inatingível.

– Lembre-se: cartão de crédito não é uma despesa em si. É preciso saber quais itens foram comprados com esse instrumento.

– Dê atenção redobrada às despesas que não se repetem todo mês, como reformas na casa, a chegada de um bebê, a troca de smartphone etc.

– Liste todas as suas dívidas com informações de parcelas, de juros e de quanto precisaria para quitá-las hoje. Esse último valor é importante – ele vai mostrar onde estamos e dar uma ideia do desafio pela frente.

Com o diagnóstico feito, é possível começar a olhar para os próximos meses. Nesse ponto, separe as despesas com dívidas (parcelas, juros) das demais. Isso vai indicar o espaço que se tem para o pagamento delas. Você pode buscar aumentá-lo cortando gastos e/ou aumentando sua renda de forma realista.

Com essa informação, é hora de trocar dívidas, procurando linhas de crédito com juros menores e negociando as atuais. Dê preferência aos parcelados – mesmo se for preciso esticar o prazo. O crédito do tipo rotativo, como cheque especial, normalmente é mais caro e não é condizente com um planejamento.

É claro que essa receita de bolo não vai servir de forma igual para casos diferentes. Mais de 25% das famílias brasileiras, para além das dívidas, encontram-se inadimplentes. Cerca de 14% declaram-se muito endividadas. Por outro lado, cerca de 28% declaram ter um endividamento que consideram ser “pouco”*.

Realidades diferentes pedem estratégias diferentes. Em casos extremos vai ser necessário atuar de outras formas, como buscar feirões para inadimplentes ou vender carro e imóvel, caso venha a possui-los. Essa última alternativa, se adotada, precisa de uma postura atenta à origem do endividamento para que ele não retorne, principalmente se a raiz da situação for comportamental.

Também nesses casos, é importante ressaltar que o não pagamento de compromissos como plano de saúde e financiamento imobiliário pode ter consequências mais graves.

Casos menos extremos também variam entre si. Dívidas de até 2 ou 3x a renda mensal, às vezes, ainda conseguem ser revertidas dentro de 1 ano, dependendo de como você se planeja. Se forem maiores, quitar nesse prazo vai exigir uma capacidade de pagamento que comprometerá quase metade da sua renda – ou até mais –, o que talvez não seja realista caso seus gastos se concentrem em itens essenciais.

É importante ter paciência. Considere priorizar a construção de uma reserva para imprevistos, mesmo que isso signifique pagar as dívidas mais lentamente. Sem ela, qualquer acontecimento fora do roteiro vai resultar em novas dívidas.

Finalizando, uma sugestão. Leve consigo que o objetivo do seu planejamento não é se punir, mas reverter o quadro para viver com mais tranquilidade. A estabilidade financeira, com o tempo, libera espaço afetivo e psíquico, ampliando possibilidades nas demais áreas.

  *Fonte: Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor da Confederação Nacional do Comércio, nov./2020.

Jaques Cohen é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do site ÉpocaNegócios.com ou da Planejar. O site e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. 

Texto publicado no site Época Negócios em 19 de janeiro de 2021.

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