Consultório Financeiro

Emprestar dinheiro ajuda ou atrapalha os filhos?

Tive uma infância muito pobre, lutei muito e ganhei dinheiro. Hoje, tenho uma ótima situação financeira e dois filhos. O mais novo possui muitas características minhas e já tem um pequeno negócio, que está muito bem. Já o mais velho vive desistindo dos empregos. Coloquei-o para trabalhar na minha empresa, mas não deu certo. Ele é casado e a esposa também não trabalha. Acabo sustentando o casal. Minha esposa quer que eu pare de ajudá-los, diz que só assim eles vão mudar. Agora, ele quer que eu financie a abertura de uma franquia para ele trabalhar com a esposa. Será que devo ajudar?

Jurandir Sell Macedo, CFP:

Caro leitor, caso o valor a ser doado ao filho mais velho comprometa significativamente sua situação financeira, definitivamente você não deve ajudar. Mas sua dúvida parece estar mais ligada a como contribuir para o desenvolvimento dos seus filhos. Por isso, se você pode ajudar, mas teme que esta não seja a melhor opção para o futuro dele, a resposta é mais complicada.

Um dia escutei de um cliente a seguinte frase: “Infelizmente nunca consegui segurar um cavalo encilhado para meus filhos montarem. Eles tiveram que aprender desde muito cedo a pular nas crinas de cavalos xucros”. Na tradição dos pampas, cavalo encilhado significa aquela oportunidade excelente. Os gaúchos costumam dizer que, se um cavalo encilhado passa na nossa frente, devemos montar o quanto antes, pois isso raramente acontece na vida.

Foi certamente segurando as oportunidades com garra e determinação que você conseguiu vencer na vida. Agora sofre por poder colocar as oportunidades na frente do seu filho e ver que, mesmo assim, ele não está aproveitando.

Se você não tivesse dinheiro, não teria escolha. Ou seu filho se viraria por conta própria ou não teria sucesso na vida. Porém, você ganhou dinheiro e agora sofre com um dilema: ajudar ou deixar o filho à própria sorte.

Ter dinheiro ajuda na criação dos filhos – e seu filho mais novo parece ser exemplo disso. Com dinheiro, podemos pagar boas escolas, cursos de línguas e esportes, viagens e programas culturais, bons planos de saúde e permitir que eles se dediquem aos estudos sem precisar trabalhar. Podemos até mesmo conseguir para eles bons empregos ou comprar uma franquia, como pede seu filho mais velho.

Por outro lado, as facilidades que o dinheiro traz podem tirar dos filhos a garra que eles precisam ter para enfrentar os desafios do mundo. Para piorar, nossa tendência é ajudar mais aqueles filhos que mais precisam ou que têm menos coragem para enfrentar a vida. Acabamos enfraquecendo os filhos mais fracos e fortalecendo os mais fortes. É o que você corre o risco de fazer novamente.

E o que fazer, então? Infelizmente, só tenho a resposta teórica. Precisamos ser parceiros dos nossos filhos. E parceiro é aquele que, quando o filho diz que vai nadando da França à Inglaterra, leva-o a refletir sobre suas possibilidades, seus pontos fortes e fracos. Caso ele se julgue preparado, pede para acompanhar de longe em um bote para lhe salvar a vida se ele falhar. A presença do bote, no entanto, pode fazer com que o filho não chegue ao limite das forças – e dar o máximo é, por vezes, o que diferencia sucesso e fracasso.

Assim, o melhor a fazer é ter uma conversa franca e direta com o filho mais velho e a nora, demonstrando que está é a sua última tentativa de ajudá-los. Depois, você pode ajudá-los a abrir a franquia e ficar de longe, observando o desenvolvimento do negócio. Caso sinta que as pernas e braços não irão aguentar, pode jogar uma boia salva-vidas. Também, para evitar cometer uma injustiça, é aconselhável fazer uma doação do mesmo valor para o filho mais novo.

Ser pai é um desafio constante e não há como treinar. A matéria-prima é aquilo que temos de mais precioso e nossos erros serão parte do produto final. Mesmo assim, ou por isso mesmo, é uma experiência fascinante.

Jurandir Sell Macedo é Planejador Financeiro Pessoal pelo Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros (IBCPF)

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. Perguntas devem ser encaminhadas para: [email protected]

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 12 de novembro de 2012.

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