Consultório Financeiro

Papel da mesada na educação financeira de crianças

Tenho duas filhas, de oito e 12 anos, que demandam bastante coisas. Gostaria de educá-las desde já a ter consciência financeira. Mesada é uma boa solução? ”.

Carlos Augusto Santos , CFP® , responde:

Em primeiro lugar, parabéns pela preocupação com o tema desde cedo. Falar de educação financeira para as crianças é tão essencialmente necessário quanto ensiná-las a escovar os dentes depois das refeições, não falar de boca cheia nem comer com os cotovelos na mesa, respeitar os mais velhos, dizer “por favor” e “obrigado”, e tantos outros valores que passamos a eles.

Especificamente sobre sua pergunta, começo com a forma de encarar a mesada: é um instrumento de educação financeira. A criança deve entender que seu direito de decidir sobre dinheiro é uma responsabilidade importante e merecida, ao qual ela fará jus se demonstrar amadurecimento compatível com a responsabilidade.

Não é presente, não é remuneração. Não use como instrumento de chantagem; não use como prêmio por boa educação; não é presente dos pais. Não considere a mesada como qualquer outra coisa além de educação financeira.

Algumas dicas de implementação que acho importantes.

A periodicidade deve ser compatível com o entendimento da criança sobre o tempo. Para crianças pequenas, a semanada é mais adequada, porque entendem que sábado e domingo descansam, segunda-feira tem aula, e assim por diante. Talvez para sua filha de oito anos seja melhor assim. Para a de 12 anos, uma vez por mês deve ser melhor, porque ela já deve ter noção melhor de como lidar com um dinheiro que dure por 30 dias.

Quanto ao valor, o ideal é negociar com a criança dentro de suas expectativas e necessidades. A de oito anos deve ter desejos mais imediatos como um gibi ou pequenos brinquedinhos. Talvez a de 12 já queira usar a cantina da escola com mais liberdade de escolha. Sente-se com cada uma e entenda suas demandas por dinheiro. É importante que entendam o princípio de que podem guardar dinheiro com disciplina para desejos maiores. Sugiro então que haja uma sobra que possam economizar para um brinquedo ou passeio mais especial. Uma coisa importante: não dê de presente o que elas estão economizando para comprar!

Apesar de todas as formas eletrônicas de pagamento cada vez mais em evidência, acredito que o bom e velho papel-moeda é a melhor forma de uma criança entender o valor do dinheiro. Se tem, compra; se não tem, não compra. Somente depois destes conceitos bem arraigados é que se deve introduzir outros mais avançados como juros (bacana quando estão conseguindo fazer economias, e um belo incentivo adicional) e crédito (que deve custar juros, mesmo que dos pais — será assim na vida adulta!)

Outra dica importante: os pais têm o instinto de proteger os filhos. Mas deixe suas filhas errarem. Consumir errado e se arrepender é um aprendizado importante para a vida. É melhor fazer isso com um brinquedo hoje do que com um carro ou apartamento no futuro!

A saúde financeira dos adultos que eles vão virar depende essencialmente dos valores que nós, pais, transmitimos a eles desde pequenos. Os filhos sempre usarão os pais como maiores exemplos. Tudo o que você fizer de positivo e de negativo vai se refletir neles. Então, tente ao máximo prestar atenção em como você trata o dinheiro, o consumo, a poupança, e policie-se para passar as mensagens que farão suas filhas serem pessoas que tenham prazer em ganhar dinheiro.

Carlos Augusto Santos (Caco) é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Associação Brasileira de Profissionais Financeiros – Planejar. E-mail: [email protected]

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 26 de dezembro de 2016.

0