Consultório Financeiro

Posso comprar imóvel e fazer escritura no nome dos filhos?

“Caso uma mulher casada queira comprar um imóvel à vista, com seu próprio dinheiro, e fazer a escritura no nome dos filhos, fazendo a tal doação, ela precisa da assinatura/permissão do marido para alguma coisa? Sei que se fosse um financiamento no nome da mulher, ela precisaria, mas nesse caso de ser à vista e a escritura no nome dos filhos?”

Luciana Pantaroto, CFP®, responde:

Prezado(a) leitor(a), sua questão é relevante e oportuna, evidenciando sua cautela com as questões patrimoniais de sua família.

Os indivíduos casados, em regra, precisam de autorização do cônjuge para doar bens imóveis, ainda que sejam bens particulares, ou seja, que não integrem o patrimônio comum do casal.

Os indivíduos casados precisam de autorização do cônjuge também para doar bens móveis que integrem o patrimônio comum do casal ou que possam integrar futura meação (a meação é, em resumo, a metade ideal do patrimônio comum do casal que pertence a cada cônjuge. O patrimônio comum do casal depende do regime de bens adotado).

No entanto, há exceções: os indivíduos casados pelo regime da separação total de bens (a partir de 2003) podem dispor de seu patrimônio sem autorização do outro cônjuge.

No casamento pelo regime da participação final nos aquestos, os cônjuges podem dispor de seu patrimônio particular sem autorização do outro cônjuge, desde que esteja convencionado no pacto antenupcial.

Assim, para que um indivíduo casado realize a doação de um bem imóvel, haverá necessidade de autorização do cônjuge, exceto nos regimes citados acima. 

Se um indivíduo casado decide doar um bem móvel (ex: uma quantia de dinheiro em espécie) aos seus filhos, a autorização do cônjuge é necessária se a quantia doada integrar o patrimônio comum do casal ou vier a integrar futura meação. O Código Civil prevê uma exceção a esta regra, dispensando a necessidade de autorização do cônjuge para doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.

Assim, a necessidade de autorização do cônjuge para que a doação ocorra depende, em geral, do regime de bens do casamento e da natureza do bem a ser doado (móvel ou imóvel), observadas as exceções acima.

É importante destacar que a lei impõe alguns limites e regras para as doações: o doador não pode doar todos os seus bens sem deixar uma parte ou uma renda suficiente para a sua subsistência. Se houver herdeiros necessários (ascendentes, descendentes e cônjuge), metade do patrimônio do doador deve ser reservado para eles. Ainda, doações de pais para filhos são consideradas como adiantamento da herança, exceto se houver previsão expressa em contrário no instrumento de doação ou em testamento.

Destaco ainda que as doações estão sujeitas ao ITCMD (Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação), que varia entre 0 e 8% a depender da legislação de cada Estado.

Por fim, doações são frequentemente utilizadas como ferramenta de planejamento sucessório, sendo permitido ao doador, por exemplo, determinar condições, termos ou encargos para que o donatário receba ou não receba a doação (desde que sejam razoáveis).

O instrumento de doação poderá determinar que a doação seja feita com reserva de usufruto, poderá conter cláusulas restritivas (inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade), e também uma cláusula de reversão, para que o bem doado retorne ao doador se o donatário falecer primeiro, etc.

Pela extensão, complexidade e particularidades do tema, é recomendável buscar orientação profissional. 

Luciana Pantaroto é planejadora financeira pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. Perguntas devem ser encaminhadas para: [email protected].

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 15 de junho de 2020

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