Seu Planejamento Financeiro

Vale a pena fazer plano de previdência privada?

Mauro Torres, CFP®, responde:

Sim, mas adecisão deve ser feita com disciplina, adequação e vigilância contínua.

Algumas considerações conceituais são necessárias à compreensão da arquitetura de produto da previdência privada, que combina gestão de riscos financeiros e atuariais (na fase de recebimento). O ciclo de vida da previdência privada tem dois períodos distintos. O de acumulação é aquele em que são gerados a renda e o patrimônio que serão utilizados na constituição das reservas de aposentadoria, em que se observa um padrão de vida mais alto e um dispêndio proporcional com serviços de saúde menor em geral. O segundo período é o da utilização da reserva.

A previdência privada é um produto que se adéqua bem à necessária formação de reservas para a aposentadoria desde que o indivíduo avalie continuamente sua exposição a riscos, respeitando seu perfil e elegendo a mais adequada entre as diferentes modalidades do produto. No Brasil, pelo nível de renda, pela poupança estrutural, pela memória inflacionária e pelo arcabouço institucional, a tendência é de que o indivíduo consuma quase toda a sua renda, sem reservas. Assim, o plano de previdência termina por incorporar uma dinâmica que se mostra saudável sob a ótica da educação financeira: poupar em decorrência de uma “obrigação” voluntariamente eleita pelo indivíduo.

Há incentivos econômicos observados no processo: fiscais e financeiros. Atualmente, pelas normas aplicáveis ao imposto de renda da pessoa física, pode-se deduzir (nos casos previstos e sob condições especificadas nas normas aplicáveis) até 12% da renda bruta anual com aportes realizados num plano de previdência privada na modalidade do PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livre), que se traduz no diferimento do recolhimento de IR. Para cada situação de renda, é necessária avaliação técnica especializada de quanto se poderia aportar com vistas à otimização do benefício fiscal. Cada indivíduo deverá examinar suas características para uma adequada estimativa de fluxo de aportes em PGBL. Outra vantagem são as aplicações periódicas de recursos, em longo prazo, em fundos que permitem diversificação de classes de ativos. Tais fundos, inclusive pelo já mencionado incentivo fiscal orientado à constituição de reservas para a aposentadoria, gozam de isenções e conferem ao titular do plano opções de tributação (tabelas progressiva ou regressiva) que terminam por potencializar os resultados financeiros.

Já o risco atuarial pode ser sintetizado assim: viver mais que o esperado e o impacto disso recair no indivíduo. Nesse sentido, o elemento central de bem estar associado à contratação de uma previdência privada é minimizar alterações abruptas no padrão de vida experimentado ao longo do tempo, que é o objetivo prioritário de um planejamento financeiro consistente, orientado pela perspectiva de longo prazo.

Ainda que se apresente a gestão própria dos recursos (na fase de acumulação) como melhor que a de uma seguradora/banco/gestor de fundo, os benefícios de ter um plano parecem superar os riscos. Já na fase de recebimento da renda, os benefícios de transferir o risco atuarial (em especial, o de longevidade) para uma seguradora se tornam totalmente claros. A seguradora gerencia, na fase de pagamento das aposentadorias, uma considerável quantidade de recursos, enquanto o indivíduo tem apenas sua própria longevidade e seu padrão de consumo sob gestão. Assim, caso seja conservador demais, pode ter um nível de vida inferior ao que poderia experimentar caso transferisse o risco para a seguradora ou, primando por um bom padrão de vida no início da aposentadoria, pode esgotar os recursos da reserva antes do último dia de vida.

É fundamental que o indivíduo avalie continuamente (desde a contratação) os seus principais parâmetros – expressos em algumas tabelas atuariais que podem tornar a contratação da renda vitalícia pouco proveitosa ao cliente, em elevadas taxas de administração que corroem o valor da reserva que deveria servir ao cliente, em reduzido repasse de excedentes ou ainda na reflexão sobre a titularidade da reserva, que na fase de recebimento da renda passa a integrar o patrimônio da seguradora. Essa reflexão poderá ajudar a esclarecer detalhes contratuais que poderiam ser percebidos como assimetria em favor do segurador. O cliente deve sempre avaliar, com profundidade e sob auxílio profissional, as diversas opções disponíveis e, como mecanismo de reconhecimento dos melhores produtos, cogitar a portabilidade como opção de acordo com as regras vigentes.

Mauro Torres é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial  Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejamento Financeiro. E-mail: [email protected]

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Texto publicado no site Época Negócios em 08 de março de 2022.

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