Seu Planejamento Financeiro

Financiamento imobiliário indexado pelo IPCA, é uma boa?

 Tiago Franco, CFP®, responde:

Nos últimos anos, independentemente da política, os técnicos responsáveis pela operação do mercado financeiro no Brasil vêm fazendo importantes movimentos para eliminar as jabuticabas do nosso sistema financeiro. A jabuticaba, provavelmente você já conhece, mas pode não saber que é uma fruta que praticamente só existe por aqui.

Dentre as várias práticas do nosso sistema financeiro, existem diversas jabuticabas. A TJLP foi a primeira a cair. Uma taxa de juros cobrada pelo BNDES para dar crédito de longo prazo. A TJLP estava sujeita a interferência política, o que acabava gerando grandes distorções.

Recentemente, foi dado mais um passo para acabar com outra jabuticaba, que é o crédito imobiliário corrigido pela TR. A TR é calculada por uma fórmula que leva em conta a taxa de juros interbancária e mais vários outros componentes que fazem dela um bicho estranho no mercado financeiro. Em contrapartida, foi permitido o uso de uma taxa prefixada e uma correção pela inflação.

Em um planejamento financeiro de longo prazo, a inflação é fator importantíssimo, uma vez que ela pode corroer todo o rendimento de um patrimônio. Dessa forma, muitas estruturas de longo prazo têm como objetivo entregar a inflação mais um prêmio para o investidor.

Influenciado pelo histórico não tão distante, algumas pessoas podem levantar o risco de a inflação disparar no Brasil. No entanto, não podemos deixar de considerar que a TR também seria impactada. A TR, que hoje tem valor zero, já chegou a valores próximos a 10% a.a. em momentos de descontrole inflacionário. Na história do real, teve média próxima a 3% a.a. e, nos últimos 10 anos, próximo a 1% a.a.

A inflação, por sua vez, tem perspectiva de queda esperada pelo governo e pelo mercado. A taxa de inflação precificada nos títulos públicos gira em torno de 3,8% a.a. para um prazo de 10 anos. Se pretende manter por um prazo maior, a componente da inflação pode te expor a um maior risco.

De qualquer forma, o impacto no valor das parcelas em um cenário de crescimento da inflação não deve ser subestimado. Da mesma forma que os juros compostos são relevante para um investimento, a correção da dívida por uma taxa maior de inflação pode aumentar a dívida de forma exponencial.

Quando olhamos as cotações disponíveis hoje pela caixa econômica, a dívida atrelada à TR tem um adicional entre 8,2% e 8,4% a.a., enquanto a dívida corrigida pelo IPCA direcionada para o mesmo público vai de 4,65% a 4,84%, o que seria algo próximo de 8,45% e 8,65%, respectivamente, quando adicionamos a previsão de inflação.

Para funcionários públicos, existem opções ainda melhores, mas só atreladas ao IPCA. Estas podem chegar a IPCA + 3,9% a.a., o que seria equivalente a 7,6% a.a..

A garantia proporcionada pelo reajuste da inflação, permitiu que os bancos fizessem uma parcela inicial menor nos primeiros anos. Se as estimativas para inflação se concretizarem, na prática, estamos falando de custos equivalentes. Ou seja, se você está no início da sua carreira com uma perspectiva de crescimento, a opção do IPCA pode te liberar um pouco mais de caixa.

O fato de o financiamento não ser uma jabuticaba pode trazer grandes benefícios no futuro. Já existem vários modelos de negócios sendo testadas por FinTechs, além de um movimento acelerado do processo de Open Banking, que irá acelerar cada vez mais a competição entre as instituições financeiras e resulta em mais alternativas para o tomador.

Adicionalmente, existe uma peculiaridade no financiamento imobiliário que propicia uma opção ao tomador do crédito. Esta opção ocorre porque você pode liquidar a operação a qualquer momento pelo valor do saldo, não importa se você optar por IPCA ou por TR. Nesse caso, especificamente, se a taxa de juros de mercado cair ainda mais, você pode amortizar a operação e obter novo financiamento a taxas menores.

Para finalizar, é importante ressaltar que, quando falamos de um financiamento, principalmente de longo prazo, é importante ter em mente que você irá se comprometer com um desembolso mensal relevante por um longo período. Assumindo que isso já foi contemplado e entendido, ficam aqui as principais conclusões:

Se for funcionário público com conta na caixa, a opção é mais simples. O custo do IPCA tem uma taxa bastante benéfica e, por outro lado, você tem uma garantia de recebimento e reajustes. Com isso, você tem um gasto menor hoje da parcela e uma manutenção deste percentual de gastos ao longo do tempo.

Se não for funcionário público, ambas as opções estão bem precificadas e, se você tem uma segurança de reajustes da sua remuneração, o IPCA pode ser interessante em frente dos avanços do mercado financeiro, mas o risco da inflação ainda permanece.

Tiago Franco é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do site ÉpocaNegócios.com ou da Planejar. O site e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.

Texto publicado no site Época Negócios em 14 de janeiro de 2020.

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