Consultório Financeiro

Como a queda nos juros influi o retorno da renda fixa?

Tenho investimentos em renda fixa. Devo me preocupar com a queda da taxa de juros?

Diana Benfatti, CFP®, responde:

Essa preocupação é natural e muito válida. A trajetória da taxa de juros é sim importante, mas o seu movimento isoladamente não determina o rendimento dos investimentos.

Muitos outros fatores são relevantes, como o indexador do investimento, os preços da curva de juros futuros, a oferta e a demanda por títulos, as diretrizes da política monetária, o movimento da inflação, os impostos etc. São temas ricos e todos merecem aprofundamento. Aqui iremos focar no impacto da inflação e do imposto de renda, principalmente sobre os juros pós-fixados diários (Selic e CDI).

 HistóricoProjeção Focus
 201320142015201620172018
Selic Acumulada8,21%10,90%13,26%14,02%10,28%8,50%
IPCA5,91%6,41%10,67%6,29%3,95%4,4%
Juros Reais Brutos2,17%4,22%2,34%7,27%6,09%3,93%
Imposto de renda (15%)1,23%1,64%1,99%2,10%1,54%1,28%
Juros Reais Líquidos0,94%2,58%0,35%5,17%4,55%2,65%

A taxa de juros “cheia” de um investimento é o que chamamos de juros nominais brutos. A diferença entre os juros nominais e a inflação são os juros reais que, em termos práticos, é quanto o seu dinheiro realmente se valorizou no período, mantido o mesmo poder de compra.

Para ilustrar, em 2016 a taxa Selic rendeu 14,02%, que são os juros nominais deste indicador, e a inflação (IPCA) foi de 6,29%. Ou seja, a inflação corroeu 6,29% do seu capital investido, portanto, com a taxa de 14,02%, o rendimento real foi de 7,27% brutos.

A maior parte dos investimentos em renda fixa têm incidência de imposto de renda, que é pago sobre os juros nominais. Assim, apesar da parcela dos juros referente à inflação ser apenas correção do poder de compra, o imposto também incide sobre ela. Consequentemente, quanto maior for a inflação em relação aos juros nominais, maior será a parcela do seu verdadeiro rendimento (os juros reais), que será corroída pelo imposto, sobrando menos juros reais líquidos (após impostos).

A tabela acima nos ajuda a visualizar a trajetória da Selic e o impacto da inflação e do imposto de renda sobre a rentabilidade real. Os dados de 2013 a 2016 são históricos e, a partir de 2017, as projeções têm como fonte o último Boletim Focus. Para calcular o imposto de renda, vamos utilizar a menor alíquota da renda fixa, que é de 15% após 2 anos.

Perceba que os juros reais em 2016 foram bem maiores que em 2015, apesar de a Selic ter sido apenas um pouco mais alta. Inversamente, a projeção de juros reais para 2017 fica um pouco abaixo do dado de 2016, mesmo com uma queda importante prevista para a taxa de juros. O impacto da inflação nos rendimentos é significativo, sendo impossível julgar o seu desempenho sem levá-la em conta.

Ademais, repare que os juros reais líquidos oscilam quase sempre de forma mais ampla que a taxa de juros e a inflação, por conta do impacto do imposto de renda no rendimento final do investimento. Mas seria possível ter rendimentos reais líquidos negativos em renda fixa? Sim, caso o imposto de renda seja mais alto que a taxa de juros real bruta.

Essa situação aconteceria caso a Selic fosse 20% e o IPCA 17%, por exemplo. Se a taxa for pré-fixada, o risco disso acontecer é maior, pois os juros nominais são fixos e um possível movimento de alta da inflação afetará diretamente os juros reais resultantes. Por outro lado, investimentos indexados à inflação têm juros reais brutos fixos (por exemplo, IPCA + 5% ao ano), mas os juros reais líquidos são resultantes do imposto de renda pago sobre o rendimento total. Portanto, em casos extremos também é possível que apresentem juros reais líquidos negativos.

Diana Benfatti é planejadora financeira pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected].

As respostas refletem as opiniões da autora, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. Perguntas devem ser encaminhadas para: [email protected].

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 31 de julho de 2017

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