Seu Planejamento Financeiro

Passar meu patrimônio para meus filhos aos poucos, pode?

Caco Santos, CFP®, responde:

Esta é uma ótima pergunta! E tem sido feita por muitas pessoas ultimamente, dada a expectativa de aumento na tributação incidente em doações e heranças (feita pelo ITCMD, Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação). Tal perspectiva fundamenta-se no fato de as alíquotas deste imposto no Brasil serem bastante inferiores às de países como Estados Unidos, França, Inglaterra, Alemanha e outros. Mas apesar de a pergunta ser boa, infelizmente não existe uma ótima e única resposta a ela…

As doações em vida são uma estratégia de planejamento sucessório interessante. Outros instrumentos bastante usados são os testamentos, seguros de vida, previdência privada, sociedades familiares, fundos exclusivos, para citar os mais comuns. A escolha por um instrumento ou outro – e, mais frequentemente, qual combinação deles – deve ser cuidadosamente estudada caso a caso. Um time composto por um advogado e um planejador financeiro trará as melhores alternativas, pois temos que cuidar tanto dos impactos financeiros quanto dos legais (em áreas como direito de família, tributário, societário, civil).

Para começar a pensar no assunto, devemos ver quais objetivos queremos atingir, sendo os mais comuns: i) minimizar a carga fiscal; ii) prevenir litígios num processo de inventário que possa suscitar discussões; iii) garantir a perpetuação do patrimônio, principalmente quando pensamos em resguardar gerações futuras de netos, bisnetos ou continuidade empresarial, e iv) proteger herdeiros incapazes, como menores de idade ou interditos.

Sabidos os motivos da preocupação, é preciso considerar o regime de bens da (s) pessoa(s) detentora(s) do patrimônio. A legislação brasileira é bastante detalhada quanto aos direitos de cônjuges e filhos dependendo de cada regime. A má notícia aqui é que existe um certo “cobertor curto” neste assunto. Por exemplo, um casal que quer ter sempre o patrimônio de cada um segregado pode optar pelo regime de separação total de bens no casamento, que funcionaria muito bem num divórcio. Contudo, no caso da morte de um dos cônjuges, o outro necessariamente herdará parte do patrimônio, mesmo que eles quisessem que os filhos ficassem com todos os bens, por exemplo.

Em seguida devemos obviamente olhar para o patrimônio a ser doado ou inventariado, bem como para as partes envolvidas. Se o que existe é um apartamento de valor equivalente para doar para cada um dos filhos fica simples. Será bem mais trabalhoso pensar em casos onde existem bens com valores muito diferentes, ou parcela significativamente variadas de bens financeiros e não financeiros (imóveis, empresas, obras de arte, jóias, etc) ou mesmo uma família mais complexa (filhos de casamentos anteriores, familiares que participam de um negócio e outros que não, condições financeiras de herdeiros muito díspares, pessoas incapazes, etc).

A esta altura o leitor já deve ter percebido que para uma pergunta relativamente simples a resposta depende de múltiplos fatores. E a melhor resposta para uma família quase certamente não será a melhor para outra.

Ao estudar com clientes situações específicas, já ouvi várias vezes que prefeririam postergar o trabalho por considerá-lo difícil, demorado e custoso. Afinal para levar a cabo um bom planejamento sucessório temos que pensar, discutir e muitas vezes negociar com os herdeiros, juntar uma série de documentos, pagar tributos, honorários de advogados e custas de cartório. Só de pensar nisso tudo dá uma preguiça, não dá?

Agora, pense na alternativa: numa eventual morte inesperada e repentina do dono do patrimônio, serão necessários os mesmos documentos, serão pagos os mesmos custos e despesas (que nessa situação podem ser ainda maiores!) Mas não se terá o benefício de ter um processo pensado a priori pelo dono da coisa toda. Conheço processos que se arrastam por décadas pela falta de entendimento entre herdeiros, pela falta de liquidez para fazer frente aos custos ou por outros fatores que não temos controle.

Por ser um processo controlado, o planejamento sucessório é a forma mais econômica, mais prática e menos conflituosa de organizar o patrimônio em vida, independentemente de seu tamanho.

Término com uma forte convicção: só não dá a devida importância ao planejamento sucessório quem (felizmente!) nunca precisou passar por um inventário!

Carlos Augusto Santos (Caco) é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Associação Brasileira de Profissionais Financeiros – Planejar. Email: [email protected]

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do site ÉpocaNegócios.com ou da Planejar. O site e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.

Texto publicado no site Época Negócios em 15 de agosto de 2017

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