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Motivação e propósito ajudam a poupar

Marcia Dessen, CFP®:

Suponha que eu te apresente um baralho com 24 cartas. Cada uma delas indica valores pessoais e propósitos de vida. Peço que selecione as 12 que mais te representam, por hipótese: família, poder, saúde, força, conhecimento, autonomia, riqueza, amizade, trabalho, amor, paz, prestígio.

Em seguida, exclua cinco; depois, elimine mais quatro, restando apenas três, às quais você não renuncia em nenhuma hipótese. Agora, verifique se o seu dinheiro está sendo destinado aos valores e propósitos que te movem. Surpreso com a falta de alinhamento? Com frequência, propósitos e despesas caminham em direções opostas.

Muita gente controla as despesas de cabeça, acha que sabe quanto gasta, não faz orçamento por ser um exercício chato e repressivo, cheio de não pode isto, não pode aquilo.

Mas não precisa ser assim. O orçamento é um exercício que vai além de simplesmente anotar as contas a pagar, tudo o que aprisiona o dinheiro que você ganha, por decisões tomadas no passado.

Pense no que você deixou de fazer e queria ter feito se tivesse mais dinheiro. Pense nas três cartas que você escolheu como as mais importantes e avalie se está canalizando o dinheiro corretamente. O que está sendo feito com o dinheiro importa muito mais do que o valor em si.

Julia e João estão desassossegados. A reserva financeira foi usada na última contingência e ainda não foi recomposta. Essa situação deixa o casal intranquilo, mas lamentam que não sobra dinheiro para isso.

Ana e Pedro, um casal jovem, sem filhos, moram em um apartamento pequeno, em um condomínio grande, muita gente, vizinhos que vivem uma fase de vida diferente da deles, poucos amigos.

Há tempos alimentam o sonho de morar em uma cidade menor, em uma casa com jardim e piscina, mas o orçamento não conversa com o sonho do casal. Ganham bem, vivem bem, desfrutam a vida, mas nem uma pequena parte do que ganham está sendo destinada para realizar o sonho que acalentam.

Diana tenta controlar as despesas, mas comete um erro básico na sua planilha, uma linha denominada “cartão de crédito” com o valor total da fatura, que abarca uma série de despesas, algumas importantes e outras tantas supérfluas, perfeitamente evitáveis. Só depois de lançar cada despesa na categoria à qual pertence ela poderá avaliar se está gastando o dinheiro como gostaria.

O argumento de que falta dinheiro não se comprova quando os números são analisados. Os recursos talvez estejam sendo destinados aos prazerosos itens de consumo, comprando presentinhos que nos damos a nós mesmos porque merecemos, e os valores e propósitos de vida, muitas vezes, esquecidos.

Se o orçamento que define quanto dinheiro vai para cada despesa estiver alinhado com os propósitos de vida, realizá-los será uma questão de tempo. Prioridades definidas, escolhas bem-feitas, disciplina e controle se conver terão em sonho realizado.

Além da motivação, é importante automatizar, criar um mecanismo para separar o dinheiro assim que for creditado e destiná-lo imediatamente ao que importa. Aplicações programadas para investir 5% do salário para compor ou recompor a reserva financeira. Outros 10% para a primeira fase do projeto da casa no interior ou na praia. Mais 20% para assegurar uma vida longeva, saudável e segura.

O que sobrar, se sobrar, será destinado às despesas básicas de subsistência e ao consumo. Bela inversão na ordem das coisas… Troque o orçamento que te aprisiona pelo que te liberta. Só depende de você.

Artigo publicado originalmente na Folha de S.Paulo em 05/04/2021.

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