Quais cuidados eu devo ter com meus investimentos, considerando o período de mudança de governo?
Na hora de investir, é preciso levar em conta todos os riscos, e não apenas os relacionados à troca de comando do país.
Victor Marques CFP®, responde:
Em um sistema cada vez mais globalizado, é necessário pensar mais do que os riscos eleitorais: todos os riscos que podem afetar o cotidiano. E com os investimentos não é diferente. Uma recessão em outro país, uma guerra do outro lado do mundo ou as eleições podem gerar grande risco para a sociedade e, consequentemente, volatilidade nos preços dos ativos. Para simplificar os riscos que afetam os investimentos é possível dividi-los em dois grupos: o risco sistemático, que afeta a economia de forma geral, e o risco não sistemático, que afeta empresas de forma específica.
O risco sistemático é democrático. Uma recessão em alguns países com aumento de inflação e taxa de juros ou uma guerra vão afetar todos os outros. Nas últimas décadas a cadeia de produção global se tornou mais internacionalizada e aumentou ainda mais o efeito da contaminação de crises localizadas. Essa contaminação afeta os investimentos na forma de volatilidade nos preços dos ativos e, por isso, costuma-se associar risco com volatilidade. Outro fator é a incerteza, que é a redução na previsibilidade de um cenário futuro e, assim como qualquer risco, também se transforma em volatilidade nos preços dos ativos financeiros. Portanto, quando existem eleições acirradas e polarizadas em um país, há um aumento da incerteza e aumento da volatilidade. Quando gestores públicos falham em gerir adequadamente o país, falham em sinalizar expectativas ou perdem a credibilidade, também aumentam a incerteza e a volatilidade.
O mercado de capitais, por sua vez, responde à crise com volatilidade. Os preços dos ativos sofrem alterações rápidas, irracionais e em grau acentuado. Muitas carteiras de investimentos, quando não preparadas adequadamente para os efeitos da alta volatilidade, podem sofrer perdas excessivas. De modo geral, o mercado perde eficiência e isso impacta negativamente seus agentes. Logo, uma estratégia de investimento robusta, capaz de conservar o patrimônio do investidor, deveria ser implementada mesmo que o cenário seja favorável para que em situações de estresse não comprometa a estratégia inicial. Não obstante, uma meta plausível de retorno ajustado ao risco do portfólio deve guiar a alocação dos recursos.
Portanto, a melhor carteira de investimentos é aquela que zera tanto o risco sistemático quanto o risco não sistemático; a questão é que essa carteira não existe. Sendo assim, é importante minimizar os riscos sistemáticos e não sistemáticos, considerando o perfil de risco do cliente, através da diversificação. Obviamente não é possível garantir um resultado em sua totalidade, mas é certo que a combinação de ativos descorrelacionados, ou seja, que possuem comportamentos diferentes entre si, é capaz de oferecer maior resiliência em momentos de incerteza.
A diversificação é geralmente conhecida como o único “almoço grátis” do mercado. Isso porque com ela o investidor consegue expor apenas parte de seus recursos a determinados riscos. Então, caso uma empresa não honre seus compromissos, o tamanho da posição não comprometerá a carteira do cliente como um todo. A ideia é possuir ativos descorrelacionados, que são afetados por tipos independentes de risco. Assim, um fato como o aumento da taxa de câmbio pode afetar a inflação de um país pressionando o valor de mercado de um título indexado, mas por outro pode beneficiar uma empresa exportadora que consta no portfólio de investimentos. Da mesma forma, momentos de grande incerteza podem aumentar a volatilidade de ativos de renda variável que são protegidos pela baixa volatilidade de ativos de renda fixa conservadores.
Para isso, é necessário entender o perfil de investidor e a disposição que este possui para tolerar os riscos envolvidos, fazendo uma combinação de ativos de renda fixa pública (como o tesouro Selic, prefixado e inflação), crédito privado (como CDB, LCA, LCI, CRI, CRA, debêntures, entre outros), ativos de renda variável (como fundos imobiliários, ações, ETFs, entre outros), ativos cambiais e alternativos, lembrando de diversificar não só o produto, mas também sua proporção dentro da carteira, o prazo, a região, a moeda e todas as variáveis que podem sofrer com um único evento. Para quem possui menor familiaridade ou dispõe de menos tempo para gerir seus investimentos, uma alternativa é alocar em fundos de investimentos, nos quais se transfere a responsabilidade de alocação para um gestor profissional. Dessa forma, a análise do investidor está relacionada à busca por bons alocadores de recursos em vez do próprio ativo.
A avaliação do perfil de risco, da montagem e da manutenção da carteira de acordo com o contexto econômico e a alteração dos riscos apresentados acima exige trabalho e dedicação do investidor. Exige acompanhamento de muitos títulos e empresas, de contexto econômico nacional e global, e de eventos aleatórios que podem trazer incerteza. Portanto, o recomendável é a busca por um profissional que possa assessorar na montagem da carteira mais apropriada para o perfil de risco do cliente e o contexto econômico que se apresenta.
Victor Marques é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejamento Financeiro. E-mail: [email protected]
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Texto publicado na Revista Época em 17 de janeiro de 2023.