Qual o motivo das quedas de Tesouro Selic e fundo DI?
Por que o Tesouro Selic e os Fundos DI estão caindo?
Lucas Reinhardt, CFP®, responde:
Nos últimos dias, um fato praticamente inédito pegou diversos investidores de surpresa. Dois dos investimentos considerados os mais seguros do mercado apresentaram queda: o Tesouro Selic e os fundos DI.
O fato é “praticamente inédito”. Já ocorreu uma vez, mais precisamente no ano de 2002, quando os órgãos reguladores implementaram a obrigatoriedade da chamada “marcação a mercado” para os fundos de investimento, o que diversos investidores não esperavam. Mas, agora, por que esse movimento está ocorrendo?
Não é novidade alguma que o efeito “black swan” trazido pela crise do novo coronavírus veio à tona. Inclusive para o governo. As despesas trazidas pelo pacote de medidas contracíclicas aumentaram, a arrecadação diminuiu e, em função disso, o governo precisou de capital para seguir honrando suas obrigações, cobrindo a falta de caixa com a contratação de empréstimos.
Para se financiar, o governo emite os chamados títulos públicos federais, que investidores pessoa física podem comprar através da plataforma do Tesouro Direto ou, indiretamente, através da esmagadora maioria dos fundos DI comercializados na indústria. Mas o que acontece quando o volume captado não é suficiente?
A resposta é óbvia: a sua taxa de juros sobe. Foi esse o movimento adotado pelo Tesouro. Um título público federal chamado LFT (Tesouro Selic), que antes remunerava a taxa Selic + uma sobretaxa de 0,04%, não foi suficiente para conseguir convencer o mercado a lhe emprestar o volume que precisava. Em função disso, o governo iniciou uma progressiva alta de juros.
Nesse sentido, o Tesouro iniciou um movimento gradativo de sucessivos aumentos nessa sobretaxa, alcançando uma remuneração de taxa Selic + um prêmio de 0,37%.
Isso significa que novos investidores que adquirirem Tesouro Selic receberão uma taxa de juros maior nos seus investimentos. Isso parece bom, mas como fica a situação do investidor que comprou o mesmo título em períodos anteriores?
É aí que entra a questão do deságio. No dia 11 de setembro de 2020, o Tesouro vendia uma LFT pelo valor de R$ 10.682,00 e pagava a taxa Selic mais um prêmio de 0,04% sobre o valor investido.
No dia 7 de outubro, menos de um mês depois, foi possível comprar o mesmo título e receber uma rentabilidade maior: taxa Selic + um prêmio de 0,37%. O mesmo investimento por um valor mais baixo!
Esse título, que em meados de setembro valia R$ 10.682,00, passou a ser negociado no início de outubro por aproximadamente R$ 10.541,00, ou seja, uma queda de 1,32%.
Paralelamente a isso, assim como os investidores podem adquirir esses títulos para sua carteira, os fundos de renda fixa geridos pelas instituições financeiras também os adquirem para rentabilizar o capital de seus cotistas. Todos os títulos que compõem a carteira dos fundos devem ser “marcados a mercado”, ou seja, precificados pelo valor de venda em determinada data, podendo ser impactados por altas ou baixas. Como teve uma queda de mais de 1%, a cota de fundos ditos “megaconservadores” entregou perdas pontuais.
E quanto ao futuro? Ao que tudo indica, esse é um movimento pontual, porém, caso o governo não encontre uma solução para a questão fiscal e as contas públicas sigam em trajetória de deterioração, futuros movimentos como esse podem ser esperados.
Lucas Reinhardt é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]
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Texto publicado no jornal Valor Econômico em 04 de janeiro de 2021