Vender um imóvel e investir em Fundo Imobiliário. É uma boa?
“Estou pensando em vender um imóvel e investir tudo o que receber da venda em Fundo Imobiliário. É uma boa decisão?”
Marcelo Melich, CFP®, responde:
A resposta ao leitor pode ser dada de uma forma restrita, ou seja, considerando apenas que ele vai vender um imóvel (não é informado se o imóvel é residencial ou comercial), e com os recursos recebidos vai aplicar numa classe de ativos similar, que são os fundos imobiliários.
Imóveis e FII são, intrinsecamente da mesma categoria de ativos. As três diferenças mais importantes são: a forma de propriedade, a tributação e a liquidez. Os FII são ativos financeiros geridos por terceiros podendo ser constituídos por imóveis (fundo “tijolo”) ou recebíveis (fundo “papel”) de um único empreendimento (comercial ou residencial), ou múltiplos imóveis e certificados.
O cotista destes fundos não tem a propriedade direta, e, com isso, se desobriga dos custos de manutenção e vacância do imóvel. Num FII, estes custos já estão refletidos no valor da cota
Falando da tributação, os fundos imobiliários são isentos de Imposto de Renda para pessoas físicas (aqueles abertos para negociação na B3 ou em Balcão, com pelo menos 50 cotistas, e desde que o maior investidor possua menos de 10% das cotas). Enquanto isso, a renda gerada por imóveis é sujeita à tabela de IR. Sendo na pessoa física, deve-se recolher o “carnê leão” mensalmente.
Havendo ganho de capital na venda direta de imóveis, as alíquotas de IR serão de 15 a 22,5% (conforme o valor do ganho). Sobre a diferença entre o valor da compra e venda das cotas (no caso dos FII), incidem 20% de IR. Os imóveis próprios também se sujeitam ao ITBI, imposto municipal incidente no momento da venda, com alíquotas que variam conforme o local (em SP, por exemplo, este imposto é de 3% sobre o valor atribuído pela Prefeitura).
Vendas de Imóveis de até R$ 440 mil são isentos de IR, e existe um benefício de isenção do imposto, desde que se use o valor apurado na venda para comprar um novo imóvel, de maior valor, num prazo de até 180 dias.
A liquidez dos imóveis depende de fatores como localização, conservação do imóvel, estado da documentação etc. Os FII podem ter suas cotas negociadas em Bolsas de Valores, e, neste sentido, sua liquidez, geralmente, é maior do que a dos imóveis. Além disso, como já mencionamos, a própria carteira do FII pode conter alguma diversificação, se constituída por mais de um imóvel ou certificado. Dito isso, trocar uma propriedade direta de um imóvel por uma aplicação em um FII pode ser uma boa decisão, considerando o potencial de geração de renda e valorização das cotas, em comparação com as do imóvel próprio.
A segunda parte da resposta é mais ampla, e o planejador financeiro deve observar outros aspectos do patrimônio do cliente: tributos, sucessão, riscos e diversificação dos investimentos. É fundamental compreender os objetivos, o momento de vida e os mecanismos de poupança (ou endividamento) do leitor, antes de avaliar se a decisão de trocar imóvel por fundo imobiliário é boa. De uma maneira geral, poupar para a aposentadoria, ou para realizar algum sonho é fruto de um planejamento, com metas e acompanhamento, que são as maneiras de garantir sua execução.
O portfólio de investimentos é uma consequência desse plano, e deve ser diversificado para conciliar o perfil de risco do leitor com a sua expectativa de rentabilidade ao longo do tempo. Sendo assim, dentro desse conceito de diversificação, é necessário analisar qual o peso deste imóvel na carteira do leitor. Como qualquer ativo, imóveis podem compor um portfólio, mas não devem ser o único bem, nem a única fonte de renda de um investidor. Portanto, se esse for o caso, vender o único ativo para aplicar numa classe de risco similar (FII) não será uma boa decisão.
Muito melhor seria se o leitor aproveitasse esse evento de liquidez para diversificar seu portfólio com classes de ativos de renda fixa e renda variável, compatíveis com seus objetivos e seu perfil de risco, e, eventualmente, alocar uma parcela em fundos imobiliários, mas nunca 100% dos valores.
Caso o leitor já tenha sua poupança financeira diversificada, e este imóvel represente uma parcela da sua riqueza, voltamos ao que foi exposto no início do texto: observados os devidos cuidados na escolha do FII (seu potencial de renda, a qualidade do gestor e dos ativos imobiliários ali existentes), a decisão da troca do imóvel por uma cota do fundo pode ser uma decisão correta.
Marcelo Melich é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]
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Texto publicado no jornal Valor Econômico em 11 de novembro de 2019