Meus investimentos na Bolsa foram péssimos. Devo tirar?
Débora Agonilha, CFP®, responde:
O mercado de ações é uma das classes de ativos que mais demanda um bom planejamento prévio, dado seu elevado nível de complexidade e volatilidade. Nesse momento no qual a volatilidade fica intensificada, frequentemente a tolerância ao risco de alguns investidores se vê desafiada. Sugiro que leve em consideração quatro pilares importantes com relação ao investimento em renda variável: 1) conhecer bem seu perfil de investidor, 2) buscar constante conhecimento e ter disciplina em acompanhar o mercado, 3) ter objetivos e visão de longo prazo, e 4) dispor em ações apenas uma quantia do seu patrimônio que não fará falta caso as coisas deem errado.
O primeiro pilar é o perfil de investidor. Existem várias ferramentas e questionários disponíveis nas instituições financeiras e corretoras para tentar mensurar a sua tolerância e capacidade de exposição a riscos, levando em conta tanto fatores comportamentais e emocionais como fatores mais objetivos, como sua necessidade de liquidez. Os questionários não dão um diagnóstico perfeito, mas ajudam bastante a evitar riscos desnecessários.
Em segundo lugar, buscar aprofundar o conhecimento sobre o funcionamento do mercado financeiro também é fundamental. Quando você investe em ações, é importante saber que está comprando uma participação no capital da empresa e se tornando sócio dela. Por isso, esteja atento às notícias e fundamentos da operação daquela empresa. Trata-se de uma empresa confiável? Você sabe o que ela faz, o que ela vende? Você compraria o produto ou serviço ofertado por essa empresa? Fatores de governança corporativa também devem ser acompanhados: você sabe quem são os principais executivos da empresa? A empresa tem políticas transparentes e alinhadas com as boas práticas de mercado?
Ainda sobre conhecimento, é importante pensar que todo investimento respeita um certo “funil” de ambientes no qual está inserido. O primeiro deles é o ambiente macroeconômico – se a empresa encontra-se no Brasil, por exemplo, vai estar sujeita ao momento econômico e tributário do país. O segundo é o setor em que atua – uma empresa de papel e celulose, por exemplo, terá suas ações impactadas se surgir uma nova regulamentação no setor. O terceiro são as próprias características da empresa versus seus pares, ou seja, se o balanço e resultados da empresa têm sido melhores e com melhor crescimento do que as empresas similares do mesmo setor.
Quem não tem experiência e nem condições para acompanhar o mercado pode sempre também optar por um fundo. Necessário analisar sempre antecipadamente qual o gestor, a política do fundo, custo, perfil, volatilidade, entre outros critérios. Em períodos de turbulência dos mercados, ter resultados positivos ou ao menos limitar perdas requer um grande trabalho de pesquisa, pois, enquanto num mercado de alta, a seleção de ações pode não ser tão relevante, num mercado de baixa, a gestão profissional pode ser essencial.
A busca de gestor profissional (via estrutura de um fundo de ações) ou aplicação em ETF (fundos de índices negociados em bolsa) podem ser alternativas interessantes para quem não tem tempo ou conhecimento, mas tem paciência. Inclusive hoje é possível ter diversificação geográfica de bolsa mesmo em carteiras de investimentos no Brasil, aplicando nas bolsas brasileiras e internacionais, o que pode ser feito via fundos e até mesmo via ETF no Ibovespa ou na bolsa americana, o S&P500.
O terceiro ponto talvez seja o mais fundamental. Só deve entrar nesse tipo de investimento quem tem visão de longo prazo. Um dos princípios mais importantes para o investimento do famoso Warren Buffet é: “Concentre-se no campo de jogo, não no placar”. A chave para o investimento de capital é PACIÊNCIA, PACIÊNCIA, PACIÊNCIA. Infelizmente, a maioria de nós não tem. Os investidores minoritários observam os mercados subirem e descerem dia a dia e ficam contando seus lucros ou perdas diariamente. Se o desempenho não for bom, ficam frustrados e vendem seus investimentos com perdas, sem aguardar com paciência o tempo suficiente para uma recuperação. Foi o que aconteceu durante a crise pós-2008; muitos desistiram e venderam suas posições no S&P500 durante o ápice do pânico. Não é o correto, pois são os investimentos feitos quando os mercados estão baixos que geram maiores lucros futuros, mas esse é o momento em que o pessimismo e as notícias negativas também estão no auge, e é preciso ter muita convicção e sangue frio. No entanto, aqueles que mantiveram seus recursos aplicados e esperaram pelo crescimento dos fundamentos de seus investimentos colheram os benefícios a partir de 2014, com seguidas valorizações do índice americano desde então.
O último ponto é a questão da liquidez e da capacidade de exposição ao risco. Existem investidores que têm uma tolerância ao risco maior e possuem visão de longo prazo, mas têm uma situação de vida no momento em que necessitam de maior liquidez e não podem abdicar de nenhuma parte do seu patrimônio caso as coisas não saiam como previsto. A capacidade de exposição ao risco do seu patrimônio então é diferente da sua tolerância ao risco emocional à volatilidade, e nesse caso não se deve investir em ações. É muito comum investidores se deixarem levar pela emoção das altas constantes da Bolsa e investirem valores de que irão necessitar em breve. Deve-se tomar muito cuidado para não errar nas contas e precisar resgatar em um mau momento.
Por fim, caso o investidor ainda se sinta desconfortável com as oscilações do mercado, o ideal é tomar a decisão de forma consciente avaliando seu perfil e momento de vida. Caso opte por ficar, o ideal é estabelecer para si próprio um horizonte de investimento mais longo para que uma potencial recuperação seja factível. Do contrário, caso opte por resgatar as aplicações, o ideal é buscar alternativas com menor volatilidade, como emissões bancárias ou alocações em crédito privado, que tenham oscilações menores e não desestimulem futuros investimentos na carteira desse investidor.
Débora Agonilha é planejadora financeira pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected].
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Texto publicado no site Época Negócios em 13 de novembro de 2018