Consultório Financeiro

O que são fundos sistemáticos?

Marcos Miranda, CFP®, responde:

É comum que os investidores, experientes ou iniciantes, sejam bombardeados com uma variedade de estratégias e alternativas de investimentos – oriundas de uma indústria financeira cada vez maior e mais complexa –, cada uma delas alegando melhorar os retornos e reduzir o risco.

No âmbito do planejamento financeiro, é importante pesquisar e estudar o máximo possível para conhecer os produtos financeiros e ativos disponíveis no mercado, a fim de verificar questões de adequação aos objetivos do investidor, à sua faixa de renda e ao seu perfil. Oportuna, portanto, a dúvida que o(a) leitor(a) apresenta. 

A melhor forma de tratar o assunto é fazendo uma análise comparativa entre algumas abordagens de investimento conduzidas pelos gestores de fundos.

Os termos “quantitativo” – ou simplesmente “quant” – e “sistemático” são frequentemente usados de forma indistinta, ainda que possuam uma pequena diferenciação. Fundos sistemáticos são fundos quantitativos, mas nem todos os fundos “quants” são sistemáticos. Nada obstante, ambos representam uma abordagem de investimento que é frequentemente considerada em oposição direta a uma abordagem tradicional.

Nos fundos tradicionais – que representam a grande maioria da indústria de fundos brasileira –, a definição das estratégias pelo gestor se apoia na sua experiência de mercado, na sua própria intuição, além da teoria macroeconômica. Os gestores tomam a decisão final, embora possam utilizar diversas ferramentas (até mesmo quantitativas) para auxiliar no seu processo de decisão. No final, porém, é uma pessoa que gera a ideia e a implementa – e não um algoritmo.

Já um fundo quantitativo é aquele em que a gestão seleciona os ativos que compõem a carteira utilizando modelos matemáticos e estatísticos projetados por uma equipe de analistas de dados, objetivando identificar padrões e tendências no mercado, e todas as decisões são tomadas baseadas nesse padrão, sob a mentoria de um gestor. Não se utiliza uma abordagem sistemática, portanto não existem regras pré-definidas. O gestor, com base em dados e análises estatísticas e matemáticas, define as estratégias de seleção e alocação dos ativos.

Os fundos sistemáticos, por sua vez, seguem um conjunto de regras ou algoritmos pré-definidos – que são, obviamente, concebidos por seres humanos – para executar decisões de investimento. (Para simplificar, pode-se pensar em “algoritmo” como uma modelagem computacional de uma receita de bolo). As decisões refletem os comandos dados pelos algoritmos de forma automática, sem interferência humana (é aqui que se diferenciam dos fundos “quants”). Por isso, um grande diferencial da gestão de um fundo sistemático é não se basear apenas no julgamento humano. Embora tal julgamento tenha sido usado para projetar, revisar e, em muitos casos, definir as regras para implementação das estratégias, no momento da decisão o modelo não é influenciado por questões comportamentais, como preconceitos de disposição. Por exemplo, o algoritmo não irá necessariamente manter negociações perdedoras (viés de aversão à perda), sendo incapaz de sentir arrependimento. E, em períodos de maiores tensões no mercado, manterá a “cabeça fria”.

Enfim, os fundos sistemáticos são um “tipo característico” dos fundos quantitativos, só que neles não há interferência humana no momento da tomada de decisão, não há impacto emocional nem viés comportamental momentâneo, pois eles seguem a “receita de bolo” pré-definida, que são os algoritmos matemáticos pré-programados que dizem como devem se posicionar. Não se trata, porém, de um fundo “caixa-preta”, onde a decisão foi tomada pelo sistema sem uma motivação. Tudo foi definido e programado antecipadamente por uma equipe de experts em ciência da computação/engenharia coordenada por um gestor humano O fundo, então, opera conforme as definições de alocação do modelo e avalia se os resultados estão de acordo com o que foi projetado. Os investidores devem tomar cuidado com declarações dos gestores, tais como: “Não é possível revelar como o modelo funciona porque se trata de informação proprietária”. Todos os algoritmos precisam ser explicáveis.

As abordagens de investimento quantitativa, sistemática e discricionária não são opostas. Todas perseguem o mesmo objetivo e podem até utilizar dados semelhantes, mas de formas diferentes, para tentar melhorar o desempenho dos investimentos. Não se pode afirmar, a priori, que nenhuma delas seja necessariamente melhor que a outra.

Marcos J. R. Miranda  é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejamento Financeiro. E-mail: ([email protected])

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. Perguntas devem ser encaminhadas para: [email protected]

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 19 de Agosto de 2024

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