Pague menos IR na venda de imóveis
Marcia Dessen, CFP®:
Incomoda a você declarar por R$ 200 mil seu imóvel residencial que vale R$ 1,4 milhão? A mim, sim. E aquele VGBL antigo, que já completou dez anos de idade, registrado na declaração por um valor muito mais baixo do que o saldo atual? Outra estranheza, não é verdade?
Ah, e as ações compradas há muito tempo que continuam registradas pelo valor de aquisição? Elas valem muito mais agora, por que não podemos atualizar o valor a cada ano? Confesso que só parei de reclamar e achar que estava errado quando entendi por que é assim.
Lembre-se de que a declaração é feita à Receita Federal e que o intuito dela é arrecadação de imposto sobre rendimentos e ganho de capital elegíveis à tributação. A arrecadação do imposto só pode ser feita no fato gerador, definido pela própria Receita, normalmente a venda (ou resgate) do ativo, evento que acorda o leão e sinaliza que está na hora de entregar ao fisco parte do ganho.
O Imposto de Renda, quando aplicável, incide sobre os rendimentos ou ganho de capital líquido, apurado sobre a diferença entre o valor de venda e o valor de compra, deduzidos os custos operacionais admitidos. A fatia do leão (alíquota) é definida em razão do tipo de ativo e do montante da renda ou ganho de capital.
Como não podemos atualizar o valor dos ativos na ficha de bens e direitos, nosso patrimônio será sempre nominal. Nem a inflação oficial pode ser utilizada para atualizar o valor dos bens, a Receita não quer saber o valor atual da riqueza de cada contribuinte, quer saber o valor nominal de aquisição, necessário para calcular o valor do ganho e finalmente definir o valor do imposto, quando for devido.
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Volto ao exemplo do imóvel. Como se trata de um ativo mantido por muitos anos, existe uma grande diferença entre o valor de compra e o valor atual de mercado. Significa que, quando o imóvel for vendido, tanto o ganho de capital quanto o imposto a pagar serão potencialmente elevados.
Se pudéssemos corrigir ou atualizar o valor do imóvel anualmente, o ganho seria menor por ocasião da venda, e menor seria o imposto devido. Bem, já vimos que não pode, mas o que podemos fazer hoje para reduzir, no futuro, o imposto sobre lucro imobiliário?
Quem realizou reformas e melhorias no imóvel, por exemplo, pode e deve adicionar o valor das despesas ao valor de aquisição no exercício correspondente.
Veja o que diz a Receita no item 636 em Perguntas & Respostas IRPF 2022. “Podem integrar o custo de aquisição, quando comprovados com documentação hábil e idônea, e discriminados na declaração de rendimentos do ano-calendário da realização da despesa:
a) os gastos com a construção, ampliação e reforma, desde que os projetos tenham sido aprovados pelos órgãos municipais competentes;
b) os gastos com pequenas obras, como pintura, reparos em azulejos, encanamentos, pisos, paredes;
c) as despesas com demolição de prédio construído no terreno, desde que seja condição para se efetivar a alienação;
d) as despesas de corretagem referentes à aquisição do imóvel vendido, desde que suportado o ônus pelo alienante;
e) os gastos com obras públicas como colocação de meio-fio, sarjetas, pavimentação de vias, instalação de rede de esgoto e de eletricidade que tenha beneficiado o imóvel;
f) o valor do imposto de transmissão pago pelo alienante na aquisição do imóvel alienado;
g) o valor da contribuição de melhoria;
h) o valor do laudêmio pago ao senhorio ou proprietário por desistir do seu direito de opção;
i) os juros e demais acréscimos pagos para a aquisição do imóvel;
j) as despesas com a escritura e o registro do imóvel, cujo ônus tenha sido do adquirente.”
Viu quanta coisa pode ser incluída no custo de aquisição? Dessa forma, será menor o ganho de capital e menor o IR devido quando o imóvel for vendido. Se você teve gastos e despesas dessa natureza em 2021, não se esqueça de atualizar o valor do imóvel na ficha de bens e direitos.
Se despesas realizadas nos cinco anos anteriores não foram declaradas, avalie se vale a pena fazer uma declaração retificadora.
Para concluir, menciono o projeto de reforma tributária que, se aprovado, permitirá a atualização do valor do imóvel na DIRPF com pagamento de apenas 4% de IR. A boa notícia é que a alíquota será bem menor do que a vigente, 15% sobre ganho de capital de até R$ 5 milhões.
A má notícia é antecipar o pagamento do imposto, desembolsar antecipadamente um tributo que poderia ser pago (ou não) daqui a muitos anos. Prometo escrever sobre isso quando e se o projeto for aprovado.
Artigo publicado originalmente na Folha de S.Paulo em 11/04/2022