Consultório Financeiro

Como proteger herdeiros de segundo casamento do pai?

Minha mãe morreu há poucos meses, nem foi concluído o inventário e meu pai já têm casamento marcado. Como proteger os herdeiros da minha mãe?”

Paula Sauer, CFP®, responde:

Falar de morte não é fácil. Para nós brasileiros o assunto é considerado um tabu e causa em algumas pessoas bastante desconforto. Vivemos em um país de várias crenças e tratar o tema é delicado. Se estamos bem, não queremos tocar no assunto; se estamos doentes, o tema fica ainda mais incômodo. Mas é preciso falar do assunto principalmente se temos dependentes financeiros.

Acredito que sua mãe tenha desejado deixá-los em uma situação confortável. Apesar disso, pela nossa experiência,

o mais comum é que ela não tenha feito um planejamento sucessório, deixado testamento, e a documentação não esteja exatamente em ordem. Isso pode fazer do inventário, que formaliza a transmissão dos bens aos herdeiros, um processo moroso.

É preciso verificar a existência de um testamento e identificar o regime de bens adotado no casamento de seus pais. Com a morte da sua mãe, existem regras diferentes para cada regime de comunhão que agora vão determinar a partilha de bens entre seu pai e os demais herdeiros necessários.

Caso sua mãe tenha deixado um testamento, independentemente do regime de casamento de seus pais, deve ser respeitada a “legítima” (parcela de 50% do patrimônio que a lei reserva aos “herdeiros necessários”, sendo eles os descendentes, ascendentes e o cônjuge). Os 50% restantes do patrimônio ela pode distribuir a quem queira e, se desejar, eleger o inventariante.

Não havendo um testamento, o mais provável é que o seu pai seja o inventariante, responsável pelo espólio (patrimônio, conjunto de direitos e deveres do falecido) até a partilha de bens.

Se for este o seu caso, é possível expor amigavelmente a inquietação dos herdeiros quanto ao próximo casamento e a herança deixada pela sua mãe? Entre os herdeiros há consenso em relação a partilha dos bens?

Se isso é uma preocupação, saiba que nenhum bem pode ser vendido sem autorização judicial até o fim do inventário. E mais, segundo o artigo 1.523. da lei número 10.406 de 10 de janeiro de 2002, o ideal é que seu pai não se case até que o inventário de sua mãe tenha chegado ao fim e que tenha sido emitida a certidão da partilha de bens.

Caso o novo casal decida manter a data do casamento anterior à partilha de bens, a lei protege os herdeiros do primeiro casamento: é obrigatório o regime de “separação total de bens”.

Neste regime, é necessário fazer através de uma escritura pública um documento chamado de “pacto antenupcial”, deixando claro que os bens adquiridos antes e durante o segundo casamento permanecerão incomunicáveis, resguardando assim, os bens e direitos dos herdeiros do primeiro casamento.

Imaginando uma outra situação, em que morre o esposo e a viúva queira se casar novamente, a lei é ainda mais exigente para proteger os herdeiros. A noiva precisa esperar por ao menos dez meses até contrair outro casamento para que não haja prejuízo aos herdeiros, havendo uma possível gravidez do cônjuge falecido. A nubente deverá provar nascimento de filho ou inexistência de gravidez na fluência do prazo.

Contrate um planejador financeiro certificado e um advogado que trate de planejamento sucessório, eles possuem conhecimento técnico e não estão envolvidos emocionalmente. É sem dúvida uma situação bastante delicada, envolve uma legislação que não estamos habituados a lidar, além de prazos e despesas, em um momento de profunda comoção.

Sinto pela sua perda. Espero que as informações tragam mais segurança.

Paula Sauer é planejadora financeira pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected].

As respostas refletem as opiniões da autora, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. Perguntas devem ser encaminhadas para: [email protected].

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 21 de agosto de 2017

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