Consultório Financeiro

Obrigação de sustentar financeiramente parentes

Tenho uma tia, 10 anos mais nova que meu pai, que não tem filhos e depende financeiramente do irmão. Se meu pai morrer antes dela, eu terei a obrigação legal de sustentá-la?

Cléber Américo Castro e Souza, CFP®, responde:

Excelente pergunta, caro leitor. Buscando ajudar no esclarecimento vou destacar alguns princípios do Direito de Família. O Código Civil no artigo 1.694 reconhece o dever alimentar entre os parentes. Esse dever, ou obrigação, tem por base o princípio da solidariedade que se pressupõe presente, nos vínculos afetivos, porém a lei orienta para se considerar uma proporção entre as necessidades do reclamante e os recursos da pessoa obrigada. (parágrafo 1º do artigo 1.694 do Código Civil).

É importante destacar qual é o conceito legal do termo parentes. São parentes os ascendentes e descendentes, isto é: pais, filhos, avós, netos, bisavós etc. – em linha reta. Existem também os parentes em linha colateral, ou, transversal, que são: irmãos, tios, sobrinhos, primos, sobrinhos-netos, etc. (artigo 1.591 do Código Civil). Porém, a lei estabelece um limite para parentesco na linha colateral e transversal, sendo reconhecidos como parentes somente até o 4º grau, a saber, primos (artigo 1.592 do Código Civil).

Embora seja possível concluir que, legalmente, existe parentesco entre sobrinhos (as) e tios (as), pois são parentes em 3º grau, não podemos concluir que a lei define obrigação de cuidado financeiro, o que o Direito chama de “alimentos”.

O Código Civil não fala de forma expressa sobre dever de alimentos entre tios e sobrinhos, ou sobrinhos e tios. É necessário fazer uma interpretação mais complexa para chegar a essa possibilidade.

Algumas informações são importantes para encontrar a melhor solução, tais como: sua tia foi casada? O ex-marido é vivo? Se sim, ele pode ser, legalmente, chamado na obrigação de alimentos; ela é viúva? O sogro e/ou a sogra, se vivos, têm obrigação de alimentos; outra possibilidade é se ela tiver mais de 65 anos e com renda familiar inferior a um quarto do salário mínimo, ou, ainda, se tiver alguma deficiência de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que, de alguma forma a impeça no exercício da participação plena na sociedade, em igualdade de condições, com as demais pessoas. Em ambos os casos pode-se buscar um benefício assistencial junto ao INSS, conhecido como Loas (Lei Orgânica de Assistência Social). Caso queira saber mais acesse o site da Previdência (saiba quem pode receber o benefício assistencial Loas).

Considerando que sua tia não tenha direito a Loas e que, perante a lei, seja reconhecida necessitada, é importante observar a ordem de parentesco estabelecida em lei para o cumprimento da obrigação de alimentos. Primeiro, se buscará parentes em linha reta (pais, avós, filhos etc). Se eles não existirem, então buscar-se-á os irmãos. Se seu pai tiver outro irmão ou irmã, o mesmo (a) é responsável, solidariamente, enquanto ambos estiverem vivos e, em caso da falta do seu pai, o irmão ou irmã será o responsável.

Assim, um sobrinho somente poderá, legalmente, ser obrigado a alimentos, se vencida todas as etapas: reconhecimento da necessidade do reclamante; inexistência de outro parente mais próximo; e ainda, que a interpretação do juiz reconheça esse dever a parentes de 3º grau, pois, como o Código Civil não deixa expressa essa obrigação, faz-se uma interpretação sistemática da lei.

Cléber Américo Castro é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]

As respostas refletem as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações. Perguntas devem ser encaminhadas para: [email protected].

Texto publicado no jornal Valor Econômico em 08 de maio de 2017

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