Posso ter diferentes perfis como investidor?
Tenho 54 anos e sempre me considerei uma pessoa conservadora. Desde que comecei a investir, sempre preservei a segurança. Já fiz alguns APIs nas instituições em que tenho conta e sempre fui classificado como ‘conservador’. Recentemente, fui abordado por um corretor, fiz o API da corretora dele e deu que meu perfil é moderado. Como isso é possível?”
Roberto C. Agi, CFP®, responde:
Caro leitor, antes de responder à sua pergunta acho válido mencionar que a CVM, através da instrução 539, obriga que os participantes do sistema financeiro que distribuem investimentos ao público só podem recomendar, realizar operações ou prestar serviços desde que verifiquem a adequação ao perfil de risco do cliente. Para cumprir esse objetivo, as instituições financeiras procuram levantar algumas informações importantes, como a experiência prévia, o horizonte de tempo, a tolerância a risco, a finalidade, a necessidade de liquidez e a situação financeira atual. Diante das respostas fornecidas, definem os perfis de investidor, que em geral são conservador, moderado e agressivo. O fato de ter havido respostas diferentes para o questionário de perfil de investidor ou perfil “suitability” pode sugerir que você alterou um ou mais pontos acima ou que o critério utilizado pela corretora é diferente do critério dos bancos em que mantém conta, dando maior peso a algumas respostas dadas. A principal diferença entre os dois perfis, conservador e moderado, é que o primeiro não renuncia à segurança, já o segundo aceitaria correr um pouco mais de risco em busca de rentabilidades mais altas.
Ainda que o questionário de perfil consiga capturar sua tolerância a risco, seria interessante verificar a aderência do perfil ao seu planejamento financeiro. O primeiro passo é observar se você já tem uma reserva de emergência constituída. A teoria recomenda manter de seis a doze meses de despesas acumulados nessa reserva, que, independentemente do perfil, deve ter características conservadoras; deve-se investir essa parcela do patrimônio em ativos de baixo risco e muita liquidez. Depois disso, pense em todos os objetivos que demandam investimentos financeiros futuros, como viagens, imóveis, educação dos filhos, legado para herdeiros etc. Finalmente, se ainda estiver trabalhando, pense em como seria a fase de sua aposentadoria, como você imagina seu padrão de vida, se terá alguma renda e como serão as despesas.
Um planejador financeiro conseguirá auxiliar no cálculo de quanto você precisará acumular para manter esse padrão até o final da vida, assim como para cumprir todas suas metas e objetivos. Diante desse montante, o profissional conseguirá calcular também qual seria o retorno necessário para atingir esse valor no futuro. Analise esse retorno exigido para entender se é mais aderente a um portfólio conservador, moderado ou agressivo. Vale reforçar que hoje a taxa Selic está em 2,0% ao ano e que uma carteira conservadora entregaria retornos brutos ao redor disso. Se perceber que para atingir seus objetivos será preciso um retorno muito maior, você pode rever alguns parâmetros da simulação, avaliando postergar o momento da aposentadoria, rever o seu padrão de vida, começar a pensar em rendas alternativas, entre outras coisas. Uma alternativa que não exclui a anterior é estudar se não faz sentido correr um pouco mais de riscos para os recursos destinados a projetos de longo prazo, como aposentadoria, por exemplo.
Temos que ter em mente que o perfil de investidor definido pelo questionário é apenas um parâmetro, parte importante do processo de alocação de recursos, contudo uma discussão aprofundada sobre seu planejamento financeiro pode contribuir bastante para tomar decisões corretas em relação a seus investimentos. Muitas vezes, o risco de não atingir seus objetivos pode ser ainda maior do que as oscilações no portfólio ao longo do tempo.
Roberto C. Agi é planejador financeiro pessoal e possui a certificação CFP® (Certified Financial Planner), concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]
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Texto publicado no jornal Valor Econômico em 21 de dezembro de 2020