Consultório Financeiro

Como fazer a divisão de imóveis entre os herdeiros?

Minha avó está com 85 anos, é viúva e possui a casa onde mora e mais alguns terrenos. É interessante fazer a sucessão enquanto ela ainda está viva ao invés de esperar a sua morte e fazer o inventário? Meu pai tem dois irmãos que também são herdeiros, como eles podem resolver a questão dos valores diferentes entre os imóveis? Quais impostos incidem sobre esses eventos?
 
Marcelo Henriques de Brito, CFP:

A fim de se esquivar de um testamento e eliminar um inventário, cuja duração pode ser longa e indeterminada, além de acarretar gastos com advogados e custas judiciais, existe a alternativa da doação, em geral com reserva de usufruto, o que permitiria à sua avó viúva usar e fruir cada imóvel enquanto viver, ficando os donatários com a chamada “nua propriedade”.
 
Sua avó poderá ainda transferir os imóveis impondo condições: impenhorabilidade (o imóvel não poderá ser dado em garantia de pagamentos futuros a credores), incomunicabilidade (nenhum cônjuge dos donatários fará jus ao imóvel em caso de separação), reversão (ocorrendo o falecimento de um donatário, o imóvel reverte em favor do doador, não sendo herdado pelos sucessores do donatário falecido) e inalienabilidade temporária ou vitalícia (o imóvel não poderá ser vendido ou transferido pelos donatários). E mais, para evitar discussões sobre a avaliação e o potencial de valorização de cada imóvel até o fim do usufruto, é possível repartir igualmente a “nua propriedade” de cada imóvel entre seu pai e seus dois tios, considerando os três irmãos como os únicos herdeiros necessários, conforme definido pela legislação brasileira.
 
Acontece que os donatários poderão se arrepender do vínculo estabelecido, denominado “condomínio”, por virem a ter interesses e expectativas distintas sobre o que fazer com cada imóvel, nomeadamente quanto aos valores e às ocasiões para locação ou venda, após o falecimento do doador. É então possível promover uma “extinção de condomínio” com o eventual pagamento de tributos sobre diferenças de valores recebidos pelos donatários. Havendo acordo, a escritura pública de extinção de condomínio é realizada em um Cartório de Notas com a orientação de um tabelião ou de um escrevente autorizado.
 
Um destes profissionais também deve orientar sobre a elaboração da escritura de doação, além de solicitar a documentação relevante, o que inclui a guia quitada do “Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação”. A forma de recolhimento do ITCMD pode variar entre estados da federação, assim como a alíquota, que em geral é 4%. A base de cálculo decorre tanto do valor declarado na escritura de doação para efeitos fiscais quanto da aceitação daquele valor pela Secretaria da Fazenda. A escritura de doação precisa ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Assim, há custas a serem pagas ao tabelião e ao oficial do registro de imóveis. Haverá um gasto adicional para cancelar o registro do usufruto com a morte do usufrutuário. Todavia, esta opção pode ser melhor do que um inventário, se os herdeiros se entenderem quanto à partilha dos bens de um parente querido.
 
Infelizmente, certas mortes fazem com que aflorem ressentimentos e acusações que podem abalar o relacionamento familiar, além de arranhar a reputação do falecido. Estes momentos de rivalidade já foram retratados em peças como “A Partilha”, de Miguel Falabella, e filmes como “Rain Man”, de Barry Levinson.
 
Verifique se cabe a você iniciar o debate sobre como repartir a fortuna de sua avó e como sua iniciativa pode impactar a relação familiar, mesmo que suas intenções sejam construtivas. Lembre que o assunto não é só financeiro. Cada caso precisa ser analisado e parentes devem perceber que “as boas contas fazem os bons amigos”. Acontece que outro provérbio indica que “a sorte faz os parentes, a escolha faz os amigos”.

 
Marcelo Henriques de Brito é planejador financeiro pessoal e possui a Certificação CFP (Certified Financial Planner) concedida pela Planejar – Associação Brasileira de Planejadores Financeiros. E-mail: [email protected]

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Texto publicado no jornal Valor Econômico em 27 de fevereiro de 2012.

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